A série de enchentes registradas no Vale do Itajaí entre outubro e novembro provocou uma pressão no governo de Santa Catarina por obras de prevenção. Prefeitos e empresários do Vale do Itajaí cobram que saiam do papel os projetos previstos há mais de uma década pela Agência de Cooperação Internacional do Japão (Jica). A preocupação é evitar que se repitam os prejuízos dos últimos meses.

Blumenau e Rio do Sul, por exemplo, enfrentaram seis inundações no período. Cidades como Pouso Redondo e Trombudo Central passaram por enchentes históricas. A última, inclusive, ficou devastada pela força das águas e praticamente metade da população acabou atingida. Além dos impactos para quem perdeu tudo dentro de casa, a situação reflete na economia e nos cofres públicos.

Dar vida às propostas elencadas lá atrás vai exigir força política dos gestores, para fazer com que o governo federal ajude a pagar a conta. O custo estimado para as sete obras consideradas prioritárias é de aproximadamente R$ 4,5 bilhões e o Estado afirma não ter condições bancar sozinho. Outra frente é mobilizar o Fórum Parlamentar Catarinense para conseguir emendas.

Minibarragens Alto Vale do Itajaí

A maioria das obras tidas como prioritárias estão no Alto Vale do Itajaí.

A lista é encabeçada pela construção de três minibarragens nas cidades Mirim Doce, Petrolândia e Trombudo Central. O professor Ademar Cordero, da Universidade Regional de Blumenau (Furb) e que atuou por 40 anos no Centro de Operações do Sistema de Alerta da Bacia Hidrográfica do Rio Itajaí-Açu (Ceops), cita que o objetivo dessas estruturas é reter a vazão de rios importantes que desaguam nos afluentes no Itajaí-Açu.

Além de beneficiar diretamente os municípios onde devem ser erguidas, elas têm capacidade de reduzir o volume de água que chega a Rio do Sul, onde se encontram os rios Itajaí do Oeste e do Sul.

O custo da construção das três barragens é estimado em R$ 180 milhões, segundo o governador Jorginho Mello. Ele afirmou à NSC que caso não consiga dinheiro do governo federal, vai tirar o recurso do cofre do Estado para bancar as obras, que ainda precisam ser licitadas. O chefe do executivo de Santa Catarina afirma que pretender começar os serviços em março de 2024.

Dragagem do Rio Itajaí-Açu

O prefeito de Rio do Sul, José Thomé, e o presidente da Associação Empresarial da cidade, Cleiton Pamplona Peters, são enfáticos sobre a necessidade de outra obra prevista pela Jica para o Alto Vale do Itajaí: a dragagem do Itajaí-Açu em nove pontos entre Rio do Sul e Lontras. Nesse trecho é preciso fazer a remoção de rochas que dificultam o fluxo da água, agravando a enchente na região.

Em nota, Peters diz que não há resiliência e nem paciência que aguentem tanta demora.

A obra exige liberação do Instituto do Meio Ambienta (IMA), o que o governo do Estado ainda precisa providenciar. Dinheiro é outro obstáculo a ser superado. Jorginho Mello disse que pediu ao governo federal R$ 700 milhões para executar o serviço. Caso não receba ou venha apenas parte do valor, ele diz que vai tirar do caixa estadual o recurso para viabilizar a medida.

O melhoramento fluvial compreende ainda um canal extravasor no Salto Pilão.

— A Jica vai nos dizer quanto de rocha precisa tirar. Entre fevereiro e março vamos começar a obra — garantiu o governador.

O professor Ademar Cordero diz que aumentar a declividade do rio e, eventualmente, alargar o leito são opções para amenizar as cheias em Rio do Sul. Na semana passada, a cidade enfrentou a pior enchente desde 1983. O nível da água na madrugada de sábado (18) alcançou 13,04 metros. A prefeitura diz que 1,7 mil pessoas foram para abrigos e outras 20 mil precisaram ir para casa de parentes e amigos.

— A situação do Alto Vale é caótica. O cenário é extremamente crítico. Os números são recordes. São milhares de famílias atingidas e prejuízos incalculáveis em todos os setores da economia. E a vulnerabilidade e o sofrimento certamente serão acentuados com o fechamento de empresas e a perda de postos de trabalho — pontuou o presidente da Associação Empresarial de Rio do Sul.

Só na agricultura o prejuízo passa dos R$ 9,1 milhões.

O prefeito José Thomé alertou para que não ocorra o que chamou de “síndrome do céu azul”, que é o esquecimento das medidas urgentes quando a chuva não está caindo.

Canais extravasores em Blumenau e Navegantes

Entre as propostas apresentadas para amenizar as cheias no Vale do Itajaí estão também duas obras que na prática servem para desviar o fluxo das águas do Rio Itajaí-Açu, para o escoamento ser mais rápido.

Uma dessas obras é projetada para Blumenau. O prefeito Mário Hildebrandt explica que a ideia é criar dois túneis com cerca de um quilômetro de extensão e 10 metros de largura a partir da Toca da Onça em direção ao Anel Viário Norte. Um deles ficaria no nível de oito metros e o outro na faixa dos 10 metros. Isso permitiria que a água não precisasse fazer a curva da Prainha, no Centro.

A obra teria capacidade de reduzir o nível do Itajaí-Açu em meio metro durante uma enchente.

Uma obra semelhante é prevista para Navegantes.

A ideia é abrir um desvio para encurtar o caminho da água até o mar. Conforme o projeto, seria um canal com 9,1 quilômetros de comprimento e sete metros de profundidade, para permitir uma vazão de 1,6 mil metros cúbicos de água por segundo. Essa foi apontada como “principal obra de melhoramento fluvial do Vale do Itajaí, com impacto positivo em toda a bacia”, segundo o Estado em 2017.

Se tirada do papel, a obra não terá interferência apenas na questão das cheias, mas também na operação dos portos de Itajaí e Navegantes. As estruturas ficam com atracamento e saída dos navios comprometidos quando o nível do rio sobe na foz. Nos últimos dois meses, o canal de acesso das embarcações passou 25 dias fechados, sem contar o período que operou com restrição.

Com menos carregamentos, o reflexo é na geração de empregos e na arrecadação das cidades.

O prefeito de Blumenau disse que como presidente da Associação de Municípios do Vale Europeu, e junto com as associações do Alto Vale e Foz, está articulando a cobrança por recursos para tirar as obras do papel. A execução ficaria a caria a cargo do governo do Estado, mas também depende de repasse da União. SC diz que os dois túneis e o canal extravasor devem custar algo em torno de R$ 3,5 bilhões.

Mário Hildebrandt frisa que as obras precisam começar por Navegantes, depois Blumenau e então a dragagem no Alto Vale. Segundo ele, a explicação é simples: as cidades abaixo de Lontras necessitam estar com a capacidade de vazão resolvidas para receber a água que vai descer mais rápido.

Barragens prontas são calcanhar de Aquiles

Apesar das cobranças recentes terem como foco a execução de novas obras de prevenção de enchentes, o calcanhar de Aquiles do governo do Estado são as barragens já existentes. Todas elas — de Taió, Ituporanga e José Boiteux — têm algum tipo de problema.

Em José Boiteux, por exemplo, é preciso consertar uma das comportas que está emperrada e depois recuperar todo o restante da estrutura danificada pelos anos sem manutenção em virtude de um impasse com a comunidade indígena Xokleng. Essa é a barragem com maior influência em Blumenau. O governo do estado se comprometeu a fazer as obras determinadas pela Justiça Federal como compensação pela inundação provocada no território legalmente demarcado.

Em Ituporanga, há problema em uma das comportas e não é possível abri-la. Além disso, a sala de comportas acabou inundadas. Em Taió, há vazamento de óleo no rio por causa de problema em uma comporta. Além disso, nas duas barragens é necessário instalar equipamento hidráulico para abrir e fechar as comportas dos canais extravasores. Neste mês, o cabo usado para essa operação em Taió se rompeu e foi preciso uma força-tarefa para consertá-lo.

O governador Jorginho Mello afirmou à NSC ter passado a responsabilidade das barragens para a Celesc, que atua com estruturas semelhantes para geração de energia. Segundo ele, a estatal tem conhecimento técnico para assumir o serviço. A ideia é que companhia estude, inclusive, a possibilidade de que tanto as barragens já existentes quanto as futuras três minibarragens possam ser usadas para gerar energia.

Fonte: NSC

ntcgroup